AMBIENTE

ONGs exigem cumprimento do plano de combate ao desmatamento

Ação protocolada por partidos políticos e entidades é maior litígio climático a chegar à Suprema Corte
Da Redação / Publicado em 12 de novembro de 2020
Ação exige que desmatamento na Amazônia seja reduzido a menos de 4 mil km2 até 2021 como determina a Política sobre Mudança do Clima

Foto: Inpe/ Divulgação

Ação exige que desmatamento na Amazônia seja reduzido a menos de 4 mil km2 até 2021 como determina a Política sobre Mudança do Clima

Foto: Inpe/ Divulgação

Uma ação por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) protocolada por representantes de sete partidos políticos junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) na noite de quarta-feira, 11, exige que o governo federal retome o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm). A ação contém um extenso levantamento com dados e análises sobre a destruição da floresta e a desestruturação de políticas ambientais promovidas pelo governo Bolsonaro.

O recurso foi elaborado por um grupo de dez redes e organizações da sociedade civil: Artigo 19, Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Conectas Direitos Humanos, Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), Engajamundo, Greenpeace Brasil, Instituto Alana, Instituto Socioambiental (ISA), Observatório do Clima e Terrazul. As organizações pedem participação como amici curiae (“amigos da corte”). Trata-se de instituições ou pessoas que fornecem informações e auxiliam as partes em um processo judicial.

De acordo com os responsáveis pela ação, a administração federal estimula desmates e queimadas por meio de um conjunto de ações e omissões que, na prática, paralisaram o PPCDAM. O plano criado em 2004 e aplicado até 2018 continua em vigor, segundo a legislação.

Entre as demandas da ADPF estão a retomada do cumprimento de metas estabelecidas pela legislação nacional e acordos internacionais assumidos pelo Brasil sobre mudanças climáticas, na prática abandonadas desde 2019.

A ação exige, por exemplo, que o desmatamento na Amazônia seja reduzido ao patamar de 3.925 km² até 2021, o que já deveria ter ocorrido em 2020, segundo a Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei n.º 12.187/2009).

Como todos os direitos humanos são impactados pela devastação ambiental, cabe ao STF determinar a aplicação da política pública em vigor, diz Mauricio Guetta, contultor do ISA e coordenador jurídico da ação

Foto: IEA/USP/Divulgação

Como todos os direitos humanos são impactados pela devastação ambiental, cabe ao STF determinar a aplicação da política pública em vigor, diz Mauricio Guetta, contultor do ISA e coordenador jurídico da ação

Foto: IEA/USP/Divulgação

A meta representa uma redução de cerca de 60% em relação à taxa oficial de desmatamento de 2019-2018 apurada pelo Inpe, que foi de 10,1 mil km2. Os autores da ação pedem uma moratória do desmatamento na Amazônia, por um ano, entre outras medidas, caso esse objetivo não seja alcançado. Nesse caso, o prazo para cumprimento da meta seria p no máximo para 2022.

A ADPF solicita ainda a redução contínua, até a extinção, da destruição ilegal das florestas em Terras Indígenas e Unidades de Conservação federais amazônicas. Aponta, ainda, violações aos direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais, além dos direitos das presentes e futuras gerações.

Para viabilizar esses objetivos, os responsáveis pela ADPF pedem ainda: um plano de fortalecimento de órgãos federais, como o Ibama, o ICMBio e a Funai; a implantação de um portal na internet com relatórios sobre ações e resultados, em linguagem clara e acessível; e a criação de uma comissão emergencial de deliberação, monitoramento e transparência da política de combate ao desmatamento, com participação da sociedade civil e coordenação do STF.

“O Brasil e o mundo não podem esperar mais. Amparados principalmente pela Constituição, mas também por acordos internacionais, defendemos que o desmatamento na Amazônia seja imediatamente combatido, de forma a salvaguardar o equilíbrio ecológico e climático das gerações presentes e futuras. Como todos os direitos humanos são impactados pela devastação ambiental, cabe ao STF determinar a aplicação da política pública em vigor, que já se mostrou exitosa quando efetivamente aplicada”, afirma Mauricio Guetta, consultor jurídico do ISA e coordenador jurídico da iniciativa.

Recordes de desmatamento e desmonte de políticas

As taxas oficiais de desmatamento crescem gradualmente desde 2012, mas bateram recordes históricos a partir de 2019, com o governo Bolsonaro. Entre agosto de 2018 e julho de 2019, o índice ficou em 10.129 km², 34% a mais que 2017-2018. Trata-se do maior número desde 2008 e a terceira maior alta percentual da história. A taxa para 2019-2020 caminha para ser um novo recorde e espera-se que seja divulgada até o fim do ano. O sistema Deter do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) estima mais um aumento de 34%. Seria a primeira vez na história que o desmatamento na Amazônia tem duas altas seguidas na casa dos 30%.

Apesar da crise ambiental histórica, os indicadores reunidos na ADPF mostram um esforço inédito da administração federal para enfraquecer instituições, normas e políticas que poderiam conter a destruição da floresta. Nos últimos dois anos, o número de multas por destruição à floresta na Amazônia caiu 61% na comparação com 2018, com queda de 29% em 2019 e 46% em 2020.

Embora o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, insista que sua pasta não tem verbas, o Ibama executou apenas 35,3% dos recursos destinados à fiscalização ambiental e meros 41,6% na prevenção e controle dos incêndios florestais, considerada a execução até 5 de outubro. A partir de 2019, o governo paralisou novos financiamentos do Fundo Amazônia, que financia parte importante das ações de órgãos ambientais, como o IBAMA, no combate ao desmatamento no bioma. Além de interromper novas doações, o governo não deu destino algum há pelo menos R$ 2,8 bilhões disponíveis para novas contratações.

Em agosto, sem nenhuma divulgação, o governo publicou o “Plano Nacional para Controle do Desmatamento Ilegal e Recuperação da Vegetação Nativa 2020 – 2023”. O documento, no entanto, é genérico e não apresenta metas, indicadores, cronograma e formas de monitoramento. Recentemente, o vice-presidente, Hamilton Mourão, disse que propôs a representantes de oito países europeus reduzir o desmatamento em 50%, até 2023. A meta não foi formalizada por nenhuma norma ou comunicado oficial.

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