OPINIÃO

Teses

Por Luis Fernando Verissimo / Publicado em 16 de dezembro de 2022

A tese de Oscar é de que homens são naturalmente polígamos

Ilustração: Edgar Vasques

Ilustração: Edgar Vasques

– O homem é naturalmente polígamo. (tese)

Foi a tese que o Oscar propôs no churrasco depois do Brasil e Chile, que todos foram ver na casa do Remi, que tinha tevê com tela grande. Os homens se cotizaram e levaram a carne e a cerveja, as mulheres levaram saladas e doces, o Remi assou. O Remi, por sinal, lançou um movimento de volta à salmoura na feitura do churrasco, sustentando que o sal grosso já cumpriu seu ciclo histórico. Mas isso não tem nada a ver com a história.

Depois das comemorações pela vitória, da carne e de muita cerveja, a conversa derivou da atuação do Ronaldinho para a Suzana Werner e daí para o sexo e o futebol, depois para o sexo em geral. E foi então que o Oscar disse a sua frase.

– O homem é naturalmente polígamo.

– Ah é, Oscar? – disse Maria Helena, sua mulher.

Todos riram, alguém disse “Iiih”, outro disse “sai dessa, Oscar”, e o Oscar se apressou a explicar que estava falando em tese, não defendendo a poligamia legal, muito menos um presumível harém particular. Mas, de acordo com sua tese, todos os monógamos ali viviam em conflito com a natureza. A mulher era naturalmente monógama. O homem não.

– Rá! – disse a Lucilene, mulher do Remi.

– Como, “rá”? – perguntou o Oscar.

– Você acha, então, que o instinto sexual é o que determina o que é natural ou não? As risadas tinham parado com o “rá”. Agora estavam todos prestando atenção.

Afinal, era uma questão científica. O Oscar pensou na resposta, girando a cerveja no copo como se isso ajudasse seu raciocínio. Depois de alguns segundos, disse:

– Acho.

– Natureza é sexo?

– Não, mas é a nossa natureza sexual que determina o nosso comportamento. Ou devia determinar. Nossa cultura monógama é antinatural.

A Lucilene tinha bebido demais. Se entusiasmara com os quatro gols do Brasil, exagerara um pouco. Normalmente, quase não falava. Agora estava de pé, nariz a nariz com o Oscar.

– O homem está no seu apogeu sexual aos 17 anos de idade, certo? Oscar concedeu o ponto.

– Certo.

– A mulher, aos 35. Certo?

Oscar abanou a cabeça, querendo dizer sim, não, talvez, mas… Lucilene insistiu.

Está provado. É científico. O macho aos 17, a fêmea aos 35. Segundo a sua tese, o único casal natural, o único casal de acordo com a natureza, seria um homem de 17 e uma mulher de 35.

Lucilene não disse “como eu”, mas foi o que todo mundo ficou pensando. Lucilene estava com 35 e Remi estava mais perto dos 70 do que dos 17.

– Todos nós somos antinaturais, está entendendo? Todos os nossos casamentos estão errados!

Julinha decidiu intervir na conversa.

– Alguém quer mais rocambole?

Em casa, a Maria Helena cobrou do Oscar.

– Tinha que começar aquela conversa?

– Foi a Suzana Werner!

E todo mundo concordou que o Remi precisava pensar menos nos seus churrascos e mais no seu casamento com a Lucilene. O Remi colecionava espetos e os guardava em ordem, pelo tamanho. Aquilo não era natural.

*Teses é uma republicação do acervo do autor.

Luis Fernando Verissimo colabora mensalmente com o Extra Classe desde 1996.

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