PM mineira monta ação de guerra para despejar assentados em plena pandemia
Foto: Gean Gomes/ MST
Mais de 450 famílias de trabalhadores rurais foram expulsas na madrugada desta quarta-feira, 12, do acampamento Quilombo Campo Grande, localizado no município de Campo do Meio, sul de Minas Gerais. O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) denunciou a violência da operação comandada pelo 64º Batalhão da Polícia Militar do governo Romeu Zema (Novo), que resultou em dezenas de feridos.
Foto: Mídia Ninja
A tropa de choque atacou primeiro a Escola Popular Eduardo Galeano, que foi interditada antes de iniciar a ação de despejo dos assentados.
Os agricultores, organizados pelo MST, há mais de duas décadas produzem no local hortaliças, frutas, aves, leite e café de forma sustentável. Na última safra, as famílias produziram mais de 9 mil sacas de café, 60 mil sacas de milho e 500 toneladas de feijão.
Ao longo desses anos, também foram construídas parcerias com organizações e instituições da região que incentivaram a produção, o fomento da educação popular e a melhoria de infraestrutura para as famílias.
PISTOLEIROS – Alvo de sucessivas investidas do governo estadual na tentativa de remover os agricultores, o assentamento está localizado em uma área de 3,6 mil hectares que pertence à massa falida da Companhia Agropecuária Irmãos Azevedo (Capia) – sobrenome de uma das mais influentes famílias de pecuaristas da região, envolvidas em crimes ambientais e disputa agrária.
A empresa, que usava as terras para a monocultura de cana de açúcar e produção de álcool, fechou em 2002 sem pagar os direitos rescisórios dos seus mais de mil trabalhadores. “São 22 anos de conflito e resistência no território, lidando com pistoleiros, a mando de Jovane de Souza Moreira. Após enfrentar cinco despejos, em diferentes áreas, as famílias do MST conhecem o caminho para retornar com mais força e conquistar a terra. Na área, estava em construção um polo de conhecimento e tecnologia em agroecologia”, protestou em um comunicado a direção mineira do MST.
Foto: Gean Gomes/ MST
Cerco com drones e viaturas
De acordo com dirigentes do MST, viaturas e drones vinham rondando o assentamento e grande parte do município de Campo do Meio desde o dia 30 de julho, quando a polícia invadiu casas e levou um trabalhador sem-terra preso. A ação foi realizada sem mandado.
O MST denunciou o objetivo de coagir e incriminar os trabalhadores, o que foi confirmado com a soltura de Celso Augusto no mesmo dia, e a nota publicada pela polícia civil. “Um facão e fogos de artifícios foram apreendidos no local, e um indivíduo preso por resistência”, diz o comunicado da PM.
Os acampados receberam dezenas de vídeos de apoio enviados pela população. Manifestações em cartas enviadas ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais e na moção on-line envolveram representantes de 24 países (Brasil, Grécia, Estados Unidos, Reino Unido, Colômbia, Austrália, Alemanha, Espanha, Nova Zelândia, Irlanda, Nigéria, Noruega, Itália, Hungria, França, Venezuela, Suíça, Uruguai, Emirados Árabes Unidos, Nicarágua, México, África do Sul, Israel, Bélgica) e de 32 entidades internacionais e nacionais, 98 coletivos e representações acadêmicas.
Foto: Gean Gomes/ MST
Violações de direitos humanos e à Saúde
O Conselho Estadual de Direitos Humanos (CONEDH), a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM), a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), subseção Minas Gerais, a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedese) alertaram, sem obter respostas, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ/MG) para as violações de direitos de uma ação despejo durante a pandemia. O documento afirma que “diante da iminência de uma lesão irreparável e grave aos Direitos Humanos e ao direito à saúde, solicita-se a suspensão da ordem de cumprimento da liminar possessória para desocupação do imóvel”.
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Em nota, o MST informou que as famílias foram levadas para outra área na região. “Sem amparo do governo Zema, aliado dos estelionatários, ex-proprietários das terras, as famílias foram abrigadas pelo MST no assentamento próximo ao local”.
O movimento denunciou que a ação de despejo não tem amparo legal e foi decidida por um juiz local. “Mesmo sendo de conhecimento de todos a manobra corrupta feita com o juiz local, nenhum órgão público conseguiu interceder para que as famílias ficassem em suas casas, mesmo no meio da pandemia. Mas nós aprendemos sempre a voltar mais fortes. E eles podem esperar, vai ter retorno. Essa terra é nossa por direito e não abrimos mão de nenhuma centímetro dela”, disse Tuira Tule, da direção estadual do MST.