EDUCAÇÃO

Alunos do IPA relatam situação de abandono e acusam tentativa de coação

Valores das mensalidades das instituições parceiras do IPA para a transição de alunos são maiores que os praticados pela Rede Metodista. Termo de Aceite é questionado
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 10 de agosto de 2023

Alunos do IPA relatam situação de abandono e tentativa de coação

Foto: Igor Sperotto

Foto: Igor Sperotto

Após ouvir da reitora do Centro Universitário Metodista (IPA), Vera Maciel, que um acordo vantajoso teria sido firmado com a PUCRS e a Ulbra para acolher os alunos da centenária instituição que irá encerrar sua atuação nesse segundo semestre, mais uma vez o corpo discente diz que vivencia um sentimento de traição.

Ao contrário do que foi afirmado na presença do diretor-geral da Rede Metodista, Ismael Forte Valentim, as universidades não irão praticar os mesmos valores e descontos do IPA nas mensalidades dos estudantes que migrarem.

Nesta quinta-feira, 10, véspera do prazo final dado pelo IPA para que os alunos que deverão sair solicitem seus documentos para dar sequência ou não a seus estudos, o clima de apreensão e indignação dos estudantes piorou.

Na segunda-feira, 7, depois da manifestação oficial da instituição,  de que iria “descontinuar” todas suas turmas consideradas deficitárias e manter somente os estudantes que colarão grau neste segundo semestre, alunos chegaram a comparar a situação do IPA ao naufrágio de um navio.

O encerramento das atividades do IPA – decisão tomada pela mantenedora com sede em São Paulo – pegou todos de surpresa na instituição, incluindo a reitora e sua equipe direta.

“Eu também, junto com toda a comunidade acadêmica e toda a comunidade local, fui pega de surpresa. Todos nós fomos. Então, não tivemos esse tempo que os alunos estão falando que nós tínhamos que ter para nos organizar”, explica Vera Maciel.

Mantenedora atropela comunidade

Concretamente, confirma a reitora, ela foi informada da decisão da Rede Metodista na quinta-feira, 3, à noite.

Vera disse que não participou das negociações que firmaram as parcerias anunciadas em sua reunião com os alunos na segunda-feira, dia em que eles deveriam retomar seus estudos.

“Não cabe a mim o julgamento. Eu sou, aqui, reitora do IPA, e tenho uma liderança de uma rede acima de mim. Eles conversaram comigo, me deram a diretriz e eu me organizei da melhor maneira”, explica.

Em um cronograma que previa o começo do semestre logo após o fim de semana, na segunda-feira, 7, criou-se a situação de perplexidade, angústia e até desespero entre professores e alunos da instituição.

O sentimento em geral é de desamparo. Apesar disso, relatos internos dão conta que equipes do IPA que já foram reduzidas por conta da situação financeira estariam “virando a noite”.

Além de se sentirem traídos por terem efetuado e pago suas matrículas e serem pressionados para tomar uma decisão até sexta-feira, 11, sobre sua vida acadêmica, os estudantes foram surpreendidos com valores acima do que iriam pagar no IPA ao buscarem informações sobre a possibilidade de transferência para a PUCRS ou Ulbra.

Condições não batem

Priscila Meneghetti que se formaria em Farmácia no IPA em 2024 está entre os estudantes que se dizem prejudicados pelo descompasso entre o que foi dito no IPA e o que está ocorrendo na prática.

Ela ficou sabendo que terá que adiar sua formatura ao ir à Ulbra para análise de currículo. Fez as contas e chegou à conclusão que as condições especiais oferecidas, de 60% de desconto nas seis mensalidades do primeiro semestre e os 50% até o fim do curso, no final acabaria gerando cerca de R$ 350,00 a mais para serem pagos mensalmente.

Isso, sem contar despesas extras, como o estacionamento, que no IPA era gratuito. No final, ela calcula que iria arcar com valores em torno de R$ 600,00 a mais do que na faculdade que encerra suas atividades.

Priscila relata que tinha 50% de desconto no IPA e pagaria neste semestre mensalidades de R$ 844,00 por todas as disciplinas.

Ela acrescenta ainda que no Centro Universitário Metodista, o curso é feito de forma seriada, com todas as matérias por um preço determinado, mas nas outras instituições a modalidade é por crédito.

A Reitora Vera Maciel posta pela reportagem em frente aos números e ao dito na reunião com os alunos confirma o constatado.

“Não é o mesmo. Não é o mesmo”, resignou-se Vera Maciel diante do questionamento. No entanto, emendou, “se pegarem o ticket da Ulbra e tirarem 60%, é quase igual ao ticket do IPA”.

Nos bastidores do IPA, o dito pela reitora aos estudantes é entendido mais como um resultado da forma que lhe chegou a decisão imposta pela rede do que por uma eventual tentativa de dolo.

“Afinal, ela, em menos de 24 horas teve que chamar às pressas coordenadores e funcionários para dar a notícia, comunicar alunos que as aulas de segunda estariam suspensas e que, no lugar delas, haveria a tal reunião”, disse ao Extra Classe um integrante do quadro funcional do IPA que pediu para não se identificar. 

Preço cheio

A reitora Vera Maciel fez questão de evidenciar que o IPA não estaria “vendendo alunos”.

Ela diz que a decisão de escolha é dos estudantes e que o IPA, inclusive, está aberto para formalizar parcerias para a transferência com outras instituições que ofereçam benefícios próximos aos praticados na IPA.

“A Ulbra dá um desconto mais atrativo, mas ela não abre mão da mensalidade dela. A PUC aceita praticar a mensalidade do IPA e dá descontos que são um pouco menores que o da Ulbra. Agora, é importante dizer que nós temos aqui alunos que são Fies, alunos que são ProUni e tem instituições que não aderem a esses programas”, justifica Vera Maciel.

Com relação à PUC, alunos que estão vendo possibilidade de transferência apontam outro problema.

“No IPA ninguém pagava o preço cheio. O preço cheio lá é R$ 1.707,00. Então, na realidade, a PUC quer fazer a mensalidade ao preço cheio que a gente pagava no IPA”, aponta Priscila.

No acordo da PUC com o IPA, os alunos que já têm algum benefício comercial ou bolsa no IPA e que optarem pela transferência terão 35% de desconto por dois semestres consecutivos.

Já para a conclusão do restante de sua formação, eles teriam as “mensalidades nos valores praticados pelo IPA, com os reajustes no padrão PUCRS que serão aplicados ao longo do período”, informa a PUC em seu site.

Outro grupo de alunos que alega prejuízo no processo de descontinuidade do IPA é o que recebe a chamada Bolsa Social da instituição, considerada como um diferencial histórico.

“É importante saber que é um grupo muito pequeno de alunos do Bolsa Social 100%. Isso em face da situação que vivemos já há um bom tempo e que fez esta nossa política social reduzir”, explica a reitora.

Termo leonino

“A intenção deles não é boa. Me desculpe a palavra, é nos dar um chute na bunda”. O desabafo é do também estudante de Farmácia, André Ferreira.

Ele que completou o 10° semestre, mas ainda tem algumas disciplinas de outros em atraso, se refere especificamente ao Termo de Aceite que é apresentado para a assinatura dos estudantes no momento em que se dirigem para solicitar sua transferência para outra instituição e receber seu histórico.

No documento, o IPA diz que diante das propostas viabilizadas e em decorrência da supressão das turmas dos cursos, o aluno mediante expressão da sua “livre vontade” não vê “a incidência de prejuízo de caráter moral, psicológico e econômico” e isenta a instituição de “qualquer responsabilidade na esfera civil, criminal e outrem pela alteração original” relativa a sua matrícula.

“Essa parte é bem malandrinha, bem espertinha da parte do IPA. Dizendo que isso não vai ferir o teu psicológico, não vai ferir o teu moral, não vai ferir o teu econômico. Se as outras universidades não praticarem os valores do IPA, vai ferir sim o econômico. Se tu ficar um semestre a mais ou dois por conta das cadeiras, vai ferir, sim, o teu moral, porque tu estava prestes a te formar numa faculdade e quando vê tu vai para outra com mais um semestre, porque não batem as cadeiras. Então, amarra muito bem o lado deles e não nos ajuda nem um pouquinho; nos algema. Claro que se tu falar que não concorda com o conteúdo do contrato e assinar embaixo que não concorda, tudo bem, tá tranquilo. Mas só para ver a tentativa do que eles estão fazendo”, denuncia Ferreira.

Outros grupos de alunos do IPA usam um termo mais forte: tentativa de coação do IPA.

Para a Reitora, “isso é uma inverdade. Nós tivemos alunos que vieram ontem aqui, pegaram a sua documentação e disseram assim: ‘não, o professor não precisa assinar isso aí, está tranquilo’. Agora tem alunos e alunos, e não existe coação. Se o aluno não quer assinar, então não assina. O IPA passou pela mesma situação em 2021. É o mesmo termo que os alunos há dois anos assinaram. Durante esses dois anos, nós não tivemos uma ação na Justiça dos alunos que saíram daqui em 2021. Nenhuma”, responde Vera.

Para ela, a indignação dos alunos se deve ao que chama “sentimento de desamparo” diante do que os alunos receberam da instituição até saberem do encerramento das atividades.

“Não há coação do aluno, nem professores, nem funcionários estão autorizados a fazer isso”, frisa.

Priscila, no entanto, disse que ao solicitar seu histórico para transferência, foi informada que somente o teria com a assinatura do termo.

A recusa só foi contornada por um funcionário que pediu que ela ressalvasse no documento que não concordava com os termos.

Preferindo que seu sobrenome não fosse exposto, o colega de Priscila e André, Eduardo resumiu seu sentimento em grupo de WhatsApp criado pelos próprios alunos para buscar uma melhor solução para as suas transferências.

“Pessoal, acho que, sinceramente, chega de ingenuidade, o IPA já abandonou todo mundo. Está todo mundo no prejuízo. Eu acho que ninguém tem que assinar nada. Ninguém tem que fazer nada que não queira”, opinou.

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