Reitor nomeado da Ufrgs fala em buscar diálogo com respeito às diferenças
Foto: Reprodução/Zoom
Na tarde desta quinta-feira o reitor nomeado pela Presidência da República e pelo MEC para assumir a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Carlos André Bulhões Mendes concedeu entrevista coletiva aos órgãos de imprensa em ambiente virtual. O Jornal Extra Classe participou e fez alguns questionamentos.
Bulhões é professor titular e diretor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Ufrgs, com 36 anos dedicados à docência. Engenheiro civil, doutor em Planejamento de Recursos Hídricos e pós-doutor em Planejamento Ambiental, atuou na perícia do rompimento da barragem de Mariana, em Minas Gerais. É diretor do Sindicato dos Engenheiros do RS (Senge) e foi conselheiro titular do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA/RS).
EXTRA CLASSE – O senhor enfrenta resistência na comunidade acadêmica, principalmente entre estudantes e entidades representativas de professores e servidores, além da rejeição à sua nomeação por ser considerada uma intervenção do Governo Jair Bolsonaro na Ufrgs, que teria o intuito de interferir na autonomia universitária. Dito isso, como o senhor pretende dialogar com esses setores que o criticam?
Carlos André Bulhões Mendes– Em primeiro lugar, muito obrigado pela pergunta. Em segundo, aproveito para lembrar que ainda sou diretor do Sindicato dos Engenheiros do Rio Grande do Sul. O Senge é uma entidade sindical de quase 80 anos. E lá eu aprendi o diálogo. Na nossa mesa, na sala dos conselhos, sentam-se pessoas das mais variadas bandeiras políticas e partidárias. E, conseguiu-se há uns dez anos algo maravilhoso, que é termos diferenças e dialogarmos em prol da engenharia. Isso é uma prática que a gente exercita. Inclusive eu sou sindicalizado e sindicalista. E sindicalista está habituado ao diálogo. Não sei se pelo meu temperamento, não saberia explicar, mas eu lido bem com diferenças. Eu acho que os sistemas estão vivos quando a entropia é alta – que é o grau de desorganização e manifestação –. Porque a verdade é sempre relativa. Não sou o dono da verdade alguma. Diálogo é a palavra-chave. Nos ambientes, seja na Associação dos Servidores, seja a Associação dos Professores, seja no DCE buscarei o diálogo independente das bandeiras de cada setor. Teremos de dialogar e eu estou aberto. Será uma das primeiras agendas depois que tivermos o mínimo de organização administrativa. Primeiro temos de garantir que a estrutura funcione para depois organizar essa agenda. Temos de organizar o diálogo interno e o diálogo externo, sempre respeitoso com as diferenças. Lidar com as entidades a gente vai lidar. Tem entidades nacionais também. Já pertenci a conselhos nacionais. Nunca é fácil.
EC – O senhor defenderá a autonomia universitária das intervenções do MEC e do governo federal?
Bulhões – Sobre autonomia, digo o seguinte: a liberdade é mais fundamental do que pão. Aliás, liberdade e consciência. Eu tenho liberdade de pensar, isso é maravilhoso. E também tenho liberdade de expressar. Porém, não deveria ter liberdade de ofender. Eu penso que essa liberdade de ofender os outros é um troço meio danado. Então dialogando e tendo diferenças o princípio da autonomia é garantido. E valem aqueles princípios que são maravilhosos e que estão no Estatuto e no Regimento Geral da Ufrgs (mostra o livro), que a gente, enquanto reitor, e que se entende que temos a função muito nobre de ser uma espécie de guardião. Um guardião estratégico do regimento e dos princípios que estão ali. Agora, autonomia, veja, eu tenho a liberdade de cátedra, mas todo ano a Ufrgs e seu reitor prestam contas ao Tribunal de Contas da União (TCU), ao Ministério da Educação (MEC) e somos fiscalizados pela Controladoria Geral da União (CGU).
EC – E a soberania?
Bulhões – Digo isso para explicar que este exercício de autonomia primeiro requer uma transparência. Outra coisa, soberania. No nosso regimento a todo momento existe a expressão “na forma da lei”. O soberano eu considero os legislativos, os parlamentos. Por mais injusto que seja eu sou obrigado a seguir a lei. Eu não faço a lei, mas sou obrigado a cumpri-la. E eu escutei isso aos gritos durante a campanha: “democracia se faz com o cumprimento das leis”. Aí entra a equação autonomia e soberania.
EC – Qual sua posição sobre as políticas afirmativas instituídas nas universidades federais?
Bulhões – Sou servidor público federal. Todos somos obrigados a cumprir o regime jurídico único. Vale lembrar o seguinte: educação é um direito de todos e um dever do Estado. Eu sou fruto de uma educação pública, gratuita, igualitária, inclusiva, democrática e autônoma. E a gente vai lutar por isso com as condições que tivermos. Vamos continuar com essa luta. Sempre de maneira respeitosa.