Carreata protesta contra fechamento de escola especializada na educação de surdos
Foto Igor Sperotto
A professora do Instituto Federal do Rio Grande do Sul Renata Heinzelmann deve toda sua formação acadêmica à Escola Especial Concórdia, de Porto Alegre. Surda desde que nasceu, a doutora em Educação pela Ufrgs foi estudar na escola aos nove meses de idade e ficou lá até se formar no ensino médio.
Foto: Igor Sperotto
Diretora da Sociedade dos Surdos do Rio Grande do Sul, Renata era uma das dezenas de pessoas que foram em carreata até a porta do colégio, na tarde do sábado, 26 – Dia nacional do Surdo –, para protestar contra o fechamento da unidade. A Aelbra/Ulbra, mantenedora do espaço que abriga 88 alunos e emprega 20 professoras e professores, já anunciou que vai fechar a Concórdia em dezembro.
“Estamos muito preocupados porque percebemos a importância estratégica da Concórdia para nossa comunidade. Quem vai acolher esses alunos? Nas escolas públicas é muito difícil, a maioria dos professores não é fluente na língua brasileira de sinais e os alunos especiais acabam ficando solitários. E solitário ninguém aprende”, disse Renata à reportagem do Extra Classe, com tradução do idioma de libras brasileiro feito pela professora Katherine Carol Halberstadt.
A Escola Especial Concórdia tem 54 anos e foi incorporada pela Ulbra no auge da universidade, em 1996. Com a crise de 2009 começaram as ameaças de fechamento, que acabam de se concretizar: em 2019, quando perdeu o status de filantropia devido ao processo de Recuperação Judicial da Aelbra (mantenedora da Ulbra), o destino foi selado.
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Patrimônio de 11 milhões
O objetivo da Ulbra/Aelbra é o patrimônio físico da Concórdia, avaliado em R$ 11 milhões. Localizada na zona norte de Porto Alegre, a escola tem ginásio, laboratórios, biblioteca, auditório, clínica de fonoaudiologia. Totalmente bilíngue, atende desde surdos moderados a casos considerados severos – daí sua referência para a comunidade gaúcha.
“Com certeza é a melhor estrutura educacional do Estado para surdos. Chegamos a ter 320 alunos, mas agora ninguém mais se dispõe a arcar com um custo mensal de R$ 130 mil. E a escola é totalmente gratuita desde 2012, não tem como ser diferente”, explica a diretora Hiltrud Elert. Ela reclama que falta uma política pública para a comunidade surda, já que a única escola estadual voltada para esse público não tem condições de assimilar os estudantes da Concórdia. E atende apenas o ensino médio.
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Carreata
A carreata percorreu várias ruas da zona norte de Porto Alegre e reuniu dezenas de pessoas. Com balões azuis e faixas de protesto pelo fechamento, a manifestação coincidiu com o Dia Nacional do Surdo.
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“Nossa mobilização visa encontrar uma solução para esse impasse, já que na rede pública é muito difícil essa inclusão devido às limitações de linguagem. A língua dos surdos é um patrimônio cultural conseguido à base de muita luta. Vamos continuar lutando”, disse a professora Katherine, que leciona história.
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Professora de português, Juliane Nunes engrossou a carreata. Mesmo com a ameaça real de perde o emprego no final do ano, a professora conta que participou da manifestação também por enxergar na Concórdia um espaço de resistência e de luta.
“Aqui todos os alunos são bolsistas, a maioria vem de comunidades bem pobres. Como vão estudar numa escola regular? Vamos lutar até o fim para manter nosso projeto político-pedagógico em funcionamento”, disse Juliana antes de iniciar o ato.
Mediação do Sindicato
Foto; Igor Sperotto
O diretor do Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul (Sinpro/RS), Marcos Fuhr, que intermedia uma solução para o impasse, disse que o Sindicato vai procurar as redes filantrópicas de ensino mais tradicionais do Estado para propor uma parceria – embora reconheça que a tarefa é difícil.
Outra possibilidade é o Estado assumir a unidade, o que envolveria transferência de patrimônio e absorção de mão de obra.
“Temos que encontrar uma forma de manter esse patrimônio cultural em funcionamento”, disse o diretor. Por força da legislação, escolas especiais podem ter no máximo entre oito e 15 alunos por turma, dependendo da série.