Selic de 13,75% é um dreno que paralisa o país, diz economista
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Redução do consumo que impacta no varejo, no investimento empresarial, desindustrialização do país, empregos e rendas cada vez mais ameaçados e endividamento da população. Esta é a breve síntese que economistas ouvidos pelo Extra Classe fazem sobre a manutenção da taxa Selic no patamar de 13,75% pelo Banco Central do Brasil (BC), que é comandado por Roberto Campos Neto, sob indicação de Jair Bolsonaro (PL) em 2019 e que permanece até 2024.
“As pessoas que continuam com seus empregos vão até gozar de um poder de compra maior, com uma inflação menor, mas a custa de pessoas que perdem seus empregos”, diz André Roncaglia, professor de economia da Unifesp, doutor em economia do desenvolvimento pela Universidade de São Paulo e colunista da Folha de São Paulo.
Ele fala de uma das formas indiretas que a Selic afeta a vida das pessoas e que se dá por meio da restrição do investimento, com uma taxa de juros mais alta. Um mecanismo que, segundo ele, o Banco Central utiliza quando entende haver inflação elevada.
“É como um freio de um automóvel. Soltar o freio não significa que o carro vai andar, mas o frear vai forçá-lo a andar mais devagar ou parar”, explica ao registrar que a taxa Selic não tem um efeito direto para estimular a atividade econômica, mas que a pode restringir.
O certo é que já há consenso não só entre economistas, mas também em grande parte do varejo e do setor produtivo nacional: a inflação no Brasil que está abaixo da média dos países desenvolvidos não se dá por excesso de consumo.
É nessa lógica que Roncaglia entende que o atual patamar da Selic está muito elevado. “Já deveria ter caído desde início do ano”, afirma.
Efeitos da Selic alta
Afetando tanto as taxas que são cobradas nos cartões de crédito, os empréstimos para as pessoas físicas e jurídicas e modalidades de crédito como hipotecas, investimentos financeiros e produtivos, a Selic tem dois principais efeitos.
O indireto já referido por Roncaglia, via restrição ou o estímulo aos investimentos, e o direto que opera pelo encarecimento do crédito, pensando especificamente nas pessoas físicas.
“Estudos recentes do BC mostram que para cada 1% de elevação da Selic, existe uma elevação de 1,6% para o crédito pessoal. O efeito é majorado. Ou seja, elevações da Selic encarecem muito e desproporcionalmente os créditos das pessoas físicas por vários motivos; um elevado grau de inadimplência, por exemplo, o que também está associado a estrutura oligopolizada do mercado bancário onde poucas instituições dominam quase que a totalidade da concessão de crédito”, explica.
Ladislau Dowbor, professor titular de pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, vê um dreno da sociedade para o sistema financeiro que acaba paralisando o país.
Segundo ele, a taxa média de juros das contratações de crédito finalizou o ano de 2022 em 29,9% ao ano, cerca de 1,5 trilhão.
“As pessoas em geral têm dificuldade em materializar na sua cabeça o que representam esses valores, mas, dividido pela população, é um custo de R$ 7 mil para cada um de nós. Daria para construir 10 milhões de casas populares. Esse volume de juros extraídos de famílias e de empresas reduz drasticamente o consumo privado e o investimento empresarial, atingindo também o emprego, e contribuindo para a desindustrialização do país. Alguma parte disso volta para a economia? Não temos esse dado para o Brasil, mas o cálculo equivalente nos Estados Unidos, do Roosevelt Institute, é de que são apenas 10%”, registra.
Para o veterano economista, dessa forma grandes grupos financeiros “sem nenhuma contribuição produtiva”, drenam anualmente via rentismo cerca de R$ 700 bilhões, o equivalente a cerca de 7% do PIB.
“Esses 7% do PIB podiam se transformar em investimentos produtivos, mas por que motivo um dono de fortuna vai arriscar no mercado real, se pode ganhar 13,75% sem risco e sem esforço nas especulação financeira?”, pergunta.