ECONOMIA

Consumidores pagarão empréstimo de R$ 17 bi às distribuidoras de energia elétrica

Modelo de empréstimo difere do que o governo destinou exclusivamente para o custeio das folhas de pagamento de micro e pequenas empresas, que arcarão com o pagamento
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 18 de abril de 2020
Linha de distribuição de energia elétrica

Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Linha de distribuição de energia nacional

Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O governo Bolsonaro disponibilizou às distribuidoras de energia, com ameaça de queda de faturamento e inadimplência devido à crise causada pela pandemia de coronavírus, empréstimo de R$ 17 bilhões junto ao Bndes. O benefício será pago pelos consumidores de energia elétrica em até 60 parcelas de forma compulsória em suas faturas de luz. A iniciativa provocou estranheza por diferir da linha destinada exclusivamente para o custeio das folhas de pagamento de micro e pequenas empresas, que arcarão com o pagamento da dívida.

Se por um lado o governo diz que deve beneficiar 1,4 milhão de micro e pequenas empresas com cerca de R$ 40 bilhões em dois meses, o recurso destinado às distribuidoras atinge no máximo 104 empresas. As distribuidoras de energia são verdadeiras maquinas de faturamento. Para se ter uma ordem de grandeza, a receita dessas empresas em tempos normais é de R$ 22 bilhões por mês em média.

Mesmo com interlocutores do ministro Paulo Guedes apontando a possível queda de 20% no consumo de energia e 20% de inadimplência no pagamento das faturas, o tratamento diferenciado chama a atenção.

Ex-professor de engenharia elétrica da PUC/RS, que preferiu não se identificar porque atualmente presta uma série de consultorias para o setor, entende que as medidas do governo são adotadas sem prioridades, dando a impressão que atendem quem tem mais lobby. “Sem critérios fica mais fácil fazer concessões aos amigos do rei”, destaca.

Outros especialistas ouvidos por Extra Classe acreditam que o benefício dado as distribuidoras abre portas para que outras empresas do setor elétrico também queiram pleitear condições semelhantes, onerando ainda mais na ponta os consumidores.

Promessas da privatização quebradas

O setor elétrico nacional passou uma gigantesca transformação durante os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso (janeiro de 1995 – janeiro de 2003). O processo de privatização que começou exatamente pelas empresas de distribuição de energia hoje mostra previsões que não se concretizaram.

No lugar de maior concorrência, o que se verifica é a concentração em poucas empresas de energia que compraram as demais distribuidoras. É o caso da Companhia Paulista Força e Luz (CPFL), que expandiu sua área de distribuição do interior de São Paulo para 2/3 do Estado do Rio Grande do Sul, com a compra da AES Sul e RGE. A CPFL teve seu controle acionário adquirido pela State Grid Corporation of China.

Outro caso é a Enel Brasil. Criada em 2005, a holding, na realidade é o marco da gigante italiana do setor elétrico em suas aquisições no país. Hoje, após o pontapé inicial com a compra em leilão de privatização (1996) da Ampla, a Enel se tornou a maior empresa de energia do país.

Da concessão para distribuir energia em 66 municípios do Estado do Rio de Janeiro, hoje a empresa está presente no Rio de Janeiro, Ceará, Goiás e em São Paulo. Com a compra da AES Eletropaulo, a holding passou a atender mais de 17 milhões de unidades consumidoras e concentrar 20% de participação no mercado.

Outras promessas que não foram cumpridas estão relacionadas ao preço da energia que, ao invés de baixar hoje é o dobro do que antes e em dólares; à  qualidade no fornecimento, que não apresentou maiores alterações; e ao alívio para os cofres públicos. “Agora pegam dinheiro do Bndes e transferem os boletos para nós. Também quero emprestado assim, pego o dinheiro e tu paga”, diz o ex-professor da PUC/RS.

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