Máscara no rosto e livro nas mãos
Foto: Igor Sperotto
Foto: Igor Sperotto
O desafio de fazer a Feira do Livro de Porto Alegre, um dos eventos mais esperados da capital, é gigantesco. Além da montagem da estrutura na Praça da Alfândega para editores, livreiros, patrocinadores, apoiadores, parceiros e escritores, fechar a programação, definir autógrafos e escolher o patrono, é fundamental uma equipe afinada para trabalhar. A adrenalina é total na hora de colocar o livro em cena no espaço onde a Feira acontece desde 1955.
Em 2020, com a pandemia, o desafio foi imenso, lembra Isatir Bottin Filho, presidente da Câmara Rio-grandense do Livro/CRL, entidade que organiza o evento: “Jamais pensamos em não fazer a Feira e optamos pelo formato online, desbravando um terreno que não dominávamos. Em 2021, com a vacinação em andamento, o horizonte é mais sereno, mas ainda desafiador”. As equipes já se movimentam para a 67ª edição, que será híbrida, com o slogan “Para ler um novo mundo”. Todos os protocolos de prevenção à covid-19 serão cumpridos. De 29 de outubro a 15 de novembro, entre 10h e 19h30min, barracas de 56 expositores (60% em relação a 2019), área infantil e juvenil, encontros, sessões de autógrafos reduzidas e espaçadas voltam à Praça para o reencontro com os leitores.
O escritor Fabrício Carpinejar, escolhido para patrono desta 67 ª edição, comemorou ao lado de Jeferson Tenório, patrono de 2020. “A festa será coletiva e de renascimento. Vamos colar as partes quebradas dentro de nós e reencontrar a alegria da convivência. Vamos sorrir pelos olhos, ainda de máscara, famintos de cultura”, projeta Fabrício.
Foto: Joel Vargas/ PMPA
A programação online será produzida em estúdio montado no prédio do Memorial do RS, com transmissão pela plataforma digital da Feira (site www.feiradolivropoa.com.br e www.youtube.com/user/feiradolivro), que abrigará as lojas virtuais dos expositores. Ao todo, serão 36 lives, às 18h e às 19h30min. O Espaço Cultural dos Correios vai sediar a administração da Feira e as sessões de autógrafos coletivos. “Faremos a Feira possível. Diante das dificuldades que a arte e a cultura enfrentam no país, a realização de um evento que facilita o acesso ao livro, com preços acessíveis, ganha um significado ainda maior”, afirma Isatir, lembrando que o Banrisul/Vero é o patrocinador máster da Feira, uma das maiores a céu aberto da América Latina e patrimônio do estado.
Na área Infantil e Juvenil, um dos destaques é a Floresta Encantada para a primeira infância, patrocinada pela Petrobras. E terá também contação de histórias, teatro de bonecos, intervenções poéticas, com animadores caracterizados como fadas, gnomos e outros seres da floresta, conta Sônia Zanchetta, coordenadora dessa área. Os autógrafos para as escolas serão entre 10h e 13h, e o agendamento para a programação da primeira infância pode ser feito pelo e-mail visitacaoescolar@camaradolivro.com.br.
Foto: Igor Sperotto
Feira do Livro será híbrida
Foto: Acervo Pessoal/Divulgação
Lu Thomé, curadora da programação oficial, definiu 2020 como o ano da resiliência, pontuando que é preciso resgatar a missão da Câmara Rio-grandense do Livro como motor de circulação do livro. “A expectativa e a esperança são grandes. Vamos retomar o convívio mesclando nomes interessantes da literatura local, nacional e internacional em uma Feira propositiva, com lançamentos, vendas e encontros estimulantes.” O online possibilitou a ampliação da Feira, que neste ano busca temas relevantes, leves e novas leituras para entender o mundo. “Falaremos do luto porque é o que vivenciamos, mas falaremos especialmente de felicidade, amizade, luz no horizonte, construção de caminhos diversos, sem esquecer o conhecimento adquirido nesta longa e consagrada trajetória”, diz Lu. A dinâmica é máscara no rosto e livro nas mãos.
Difundir o livro, reafirmar a importância da leitura e expandir o diálogo com camadas importantes da população sempre estiveram entre os objetivos da CRL. Neste ano, não será diferente. “Quando abrimos espaço para a nossa diversa produção editorial, através da exposição, do debate, da divulgação e da venda do livro, com ações para crianças, jovens e adultos, reafirmamos nossa identidade”, sintetiza Isatir.
Paixão pela difusão do livro e da leitura
Foto: Igor Sperotto
A jornalista Sônia Zanchetta integra a Comissão Executiva da Feira do Livro de Porto Alegre desde 1997. Quando voltou ao Brasil depois de 17 anos no Equador, seu desejo era trabalhar como produtora cultural com foco na leitura. “Tem tudo a ver com minha vocação. Ler é um potente instrumento para nossa emancipação”, declara. Esta será a 25ª edição da Feira de que participa.
Foram muitas mudanças e conquistas positivas para o universo infantojuvenil. A construção de uma programação voltada para livros, leitura e literatura e o ciclo O Autor no Palco, que Sônia e a professora Nóia Kern criaram, são pontos altos do evento. Na sequência, vieram: QG dos Pitocos e a Bebeteca, focados na primeira infância; Casa do Pensamento para o público adolescente; Ateliê da Imagem e uma relação forte com editores, distribuidores, escritores, ilustradores, professores, bibliotecários e parcerias que contribuíram para qualificar a Área Infantil e Juvenil e para a visitação escolar organizada e produtiva, referência para outros municípios.
Sônia ressalta a criação do Núcleo de Formação de Mediadores de Leitura da Câmara Rio-grandense do Livro, que assumiu a curadoria da programação dos autores para a área, em parceria com as secretarias de Educação, com atividades prévias e durante a Feira. O Núcleo é responsável pela construção de um acervo de referência em literatura infantil e juvenil, com oito mil livros disponíveis para consultas na sede da CRL e na Biblioteca Moacyr Scliar, que vai para a Praça, com acesso livre para o público.
Apaixonada pelo que faz, Sônia criou a Biblioteca Comunitária Sol e Lua em Cachoeirinha, onde mora. Começou com livros da sua biblioteca colocados na garagem da casa, que chamaram atenção dos vizinhos. Passou a emprestar, trocar, doar, até batizar o movimento de Quitanda da Leitura. Dali foi para o parque da cidade e nasceu o Piquenique da Leitura. Cada pessoa pegava o livro que interessava. A iniciativa passou a realizar-se aos domingos durante quatro anos seguidos, o que inspirou outros tantos piqueniques de leitura no RS e em outros estados.
Inquieta e atenta, Sônia assumiu em 2013, em parceria com a estudante de Pedagogia Cristiane Teixeira, a biblioteca de uma associação de moradores fechada há anos. E nasceu o Ponto de Leitura Sol e Lua, que passou a chamar-se Biblioteca Comunitária Sol e Lua. Em 2014, a Quitanda da Leitura foi premiada no Concurso Mais Cultura/Pontos de Leitura, do Ministério da Cultura, e os recursos foram investidos na criação da Jovemteca, sala especial para adolescentes.
Fotos: Igor Sperotto
Em julho de 2017, nasceu, em uma parada de ônibus da principal avenida de Cachoeirinha, a Parada da Leitura, abastecida com dezenas de livros. Em julho de 2020, foi fundado o Instituto Cultural e Social Ágora, entidade mantenedora da Biblioteca Comunitária, e Sônia assumiu a presidência. Administra, ainda, os projetos de leitura e a Semana da Poesia, que em novembro chega à 9ª edição, além de criar outros projetos em benefício da comunidade e de três bairros de alta vulnerabilidade social.
Criou, também, mais três projetos de leitura: Magrela dos Livros – Bicicleta-biblioteca que distribui livros entre alunos de escolas próximas; Nossa Comunidade Lê Poesia e Poesia na Ponta da Língua, em parceria com a Escola Municipal Maria Fausta Teixeira, e o Projeto Semente, com livros doados pela família do escritor Walmor Santos, que morreu neste ano, envolvendo escolas de Cachoeirinha e de dez municípios gaúchos. As atividades são estimulantes e a equipe que trabalha está sempre em busca de apoio, doações e novas parcerias, acrescenta Sônia, entusiasmada.