AMBIENTE

Justiça determina paralisação das obras no Parque Harmonia

TJRS acatou ação popular que comprova danos ambientais e ao patrimônio histórico. Decisão alerta para o risco de extinção. PGM vai recorrer
Por Gilson Camargo / Publicado em 31 de julho de 2023

Foto: Wilson Rosa/RDC TV/ Reprodução

Decisão da 10a Vara de Porto Alegre alega danos ambientais e alteração do projeto licenciado para determinar a paralisação das obras no Harmonia

Foto: Wilson Rosa/RDC TV/ Reprodução

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) concedeu na manhã desta segunda-feira, 31, liminar que determina a suspensão das obras do Parque Maurício Sirotsky Sobrinho (Parque Harmonia), em Porto Alegre. As obras também são questionadas devido a danos socioambientais e fraude no projeto licenciado, conforme aponta o Ministério Público de Contas (MPC). Na semana passada, o procurador-geral do MPC, Geraldo Da Camino pediu uma auditoria no local pelo Tribunal de Contas do Estado.

A decisão do TJRS, pela paralisação da obra, na manhã desta segunda-feira, 31, foi assinada pela juíza Gabriela Dantas Bobsin, da 10ª Vara da Fazenda Pública, que acatou a uma ação popular contra a concessionária vencedora da licitação para a exploração do parque por 35 anos e a Prefeitura de Porto Alegre.

A iniciativa aponta a ocorrência de danos ambientais, paisagísticos e ao patrimônio cultural “perpetrados pela concessionária ré no Parque Harmonia, bem como a omissão do Município de Porto Alegre em fiscalizar”.

Também embasa a decisão da juíza a denúncia de descumprimento das normas de viabilidade urbana: “as obras realizadas no local extrapolam o Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU) aprovado pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano Ambiental (CMDUA)”, afirmou. Além disso, o projeto executado não é o mesmo que foi aprovado pela Câmara de Vereadores da capital, segundo declarou a arquiteta que elaborou o plano original.

Para a magistrada, “os fatos noticiados pelos autores são gravíssimos e estão amparados por evidências de que a iniciativa privada, com a permissão do Município, promove verdadeira devastação em área do conhecido Parque da Harmonia”.

Projeto aprovado foi substituído

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“A única alternativa para o momento, quando já se acumulam danos perpetrados a olhos vistos da população, é o embargo da obra”, observou a juíza

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A juíza acrescenta ainda que a área conservava até o início das obras substancial número de “espécies arbóreas e fauna” que igualmente necessita ser alvo de proteção. “As fotografias apresentadas demonstram que onde existia vegetação foi aberta uma “clareira”, com máquinas e implementos, inclusive retroescavadeira, agindo no local de modo a descaracterizá-lo totalmente”, anota Gabriela ao determinar a paralisação.

As provas apresentadas pelos autores foram fundamentais para a decisão, relatou. “A parte autora foi pródiga ao juntar matérias jornalísticas, dando conta de reuniões levadas a efeito na Câmara Municipal, envolvendo entidades e integrantes da sociedade civil, inclusive profissionais que atuaram na elaboração do projeto original aprovado pelo Conselho do Plano Diretor, dando conta de que o projeto foi alterado indevidamente, ou seja, de forma unilateral, sem ser submetido aos órgãos de controle, resultando na devastação ora denunciada”, sublinhou.

No dia 11 de julho deste ano, em uma audiência na Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam), da Câmara de Vereadores, a arquiteta autora do Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU), Eliana Castilhos, declarou que o projeto em implantação não é o que foi aprovado. “Não é uma mudança, são várias. E não foram autorizadas. A legislação pede que sejam autorizadas por escrito pelo autor e isso não foi respeitado”, repreendeu a juíza.

Essa adulteração foi confirmada pelo arquiteto Alan Cristian Furlan, ex-diretor do consórcio e um dos responsáveis pela elaboração do projeto de reforma. “Aprovamos o plano de intervenções dentro da prefeitura e depois o EVU. A GAM3 optou por chamar outra empresa, que fez esse procedimento incorreto sem a nossa autorização, e começaram a executar essa nova versão”, aponta Furlan.

Segundo ele, o projeto inicial mexeria com pouco mais de cem árvores, e que o “projeto deles (o atual) mexeria com 432”. Consta nos autos que “o profissional fez uma denúncia formal ao Conselho de Arquitetura e Urbanismo do RS (CAU- RS) e ao próprio MP, no qual teve o apoio do vereador Aldacir Oliboni (PT) e das entidades ambientais Ingá Estudos Ambientais, Acesso e Atuapoa”.

A caminho da extinção

Gabriela explicou ainda que a paralisação se justifica pelas intervenções, que deveriam ser mínimas, e que como estão sendo feitas, conduzirão praticamente à extinção de um terço das árvores do Parque da Harmonia, já que o previsto é que “sejam extirpadas mais de 400 árvores do local”, além de obras de arte e do acervo histórico e cultural porto-alegrense, patrimônio imaterial irrecuperável, sem contar que desalojada a fauna ali presente e que se valia da vegetação para a sobrevivência, no rigoroso inverno”.

Ao concordar com a omissão do poder público alegada pelos autores da ação popular, a juíza esclareceu que “não se tem notícias das providências quanto à fauna, pois das fotos do “canteiro de obras” não se visualiza a existência de pessoas especializadas catalogando ou removendo os espécimes para local seguro e não se tem notícia de que o que resta do parque seja suficiente para os espécimes que sobraram”. paralisação

Ela alerta que as evidências são de que o parque se encaminha para a extinção, “a pretexto de cumprimento de concessão pública para transformação e descaracterização completa da área verde que integra patrimônio da sociedade porto-alegrenses, piorando sobremaneira a qualidade do ar, a refrigeração no local pela substituição excessiva do verde natural por materiais artificiais e combinados, degradando a fauna silvestre”.

“Portanto, a única alternativa para o momento, quando já se acumulam danos perpetrados a olhos vistos da população, é o embargo da obra, pelo menos até que aportem esclarecimentos suficientes no sentido de que está ocorrendo o manejo adequado e responsável da área por parte da concessionária, na medida em que há muita probabilidade do direito alegado pelos autores, além do perigo de dano na continuação das intervenções”, concluiu.

PGM vai recorrer contra paralisação

Em nota, a Procuradoria-Geral do Município (PGM) informou que irá recorrer da liminar. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus), responsável pela gestão dos parques e áreas verdes da Capital, reiterou “confiança na integridade e legalidade das obras executadas pela GAM3 Parks, concessionária responsável pela área”.

De acordo com a PGM), a prefeitura já forneceu os esclarecimentos necessários sobre a obra durante visita ao parque e também ao entregar documentação solicitada pelo Ministério Público Estadual e pela Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Câmara Municipal.

“A prefeitura reconhece a importância dos órgãos de controle no desempenho de suas atividades de fiscalização e reforça sua convicção na transparência e legalidade do processo. A paralisação das obras poderá impactar na realização do Acampamento Farroupilha, que acontece de 1º a 20 de setembro”, alega a decisão favorável à paralisação.

Os procuradores argumentam ainda que dos 1.253 exemplares que o local abrigava quando o espaço foi concedido à GAM3 Parks, em 2021, a concessionária retirou 103 árvores. Deste total, conforme a Smamus, 15% apresentavam problemas fitossanitários e riscos para os frequentadores do parque.

“Além disso, 45% eram espécies exóticas, que não são naturais de Porto Alegre, uma vez que o Harmonia foi criado por meio de aterramento. Para cada planta removida, cinco nativas serão plantadas pela concessionária para preservar o equilíbrio ambiental. Neste caso, a compensação proporcionará em torno de 500 exemplares de espécies nativas”, justifica.

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