ECONOMIA

Ceitec é salva de ser extinta e corre atrás do prejuízo

Única empresa da América Latina capaz de todo o processo para desenvolver, projetar e fabricar semicondutores discute formas de contratação e resgate da confiança do mercado
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 17 de novembro de 2023

Ceitec é salva de ser extinta e corre atrás do prejuízo

Foto: Reprodução de vídeo/Ceitec

Foto: Reprodução de vídeo/Ceitec

Dez dias após o governo Lula (PT) anunciar a retomada das operações do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), empresa de semicondutores que foi colocada em liquidação por Jair Bolsonaro (PL) em dezembro de 2020, o ritmo se intensifica dia a dia na organização. A recomposição emergencial do quadro funcional tem tomado conta de grande parte do tempo do professor Augusto Cesar Gadelha Vieira que está à frente da estatal desde fevereiro deste ano.

Ele, que assumiu a posição do oficial da reserva da Marinha, Abílio Eustáquio de Andrade Neto, liquidante indicado por Bolsonaro para a empresa abrigada no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), disse ao Extra Classe que a ideia de ter o governo como cliente não será abandonada, ao contrário do que foi sugerido por notícias. Ela conviverá com os novos focos de mercado da empresa, o setor automotivo e a área de transição energética.

“O mecanismo de compras governamentais é utilizado no mundo todo para dar incentivo a empresas estratégicas, estatais ou privadas. Por exemplo, agora mesmo nos Estados, bilhões de dólares da Força Aérea Americana estão sendo destinados para contratos sensíveis da economia americanas”, registra Gadelha Vieira ao lamentar que no Brasil a prática “não se completava”.

Casos como os chips para os passaportes nacionais e o Sistema de Identificação Veicular entre outros veem à lembrança do executivo.

Mercado em ascensão

O professor que, segundo a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, continuará inicialmente no comando da estatal registra porém que “estamos querendo, agora, é concentrar na demanda de um mercado que está em ascensão, um mercado que tem uma demanda muito acima da oferta”.

Ele se refere a indústrias que cada vez mais estão requerendo dispositivos de conversão de energia de alta potência. Entre elas a automotiva e, “o que mais entusiasma a ministra”, as que trabalham nos processos de transição energética.

Concretamente, explica Gadelha Viera, o mercado é extremamente promissor. Qualquer indústria que precise transformar uma corrente alternada no ponto principal, aumentar, fazer transformações de voltagem, estão demandando microeletrônicos que podem ser fabricados na Ceitec.

“É uma tecnologia que requer que os ciclos possam ter uma capacidade elétrica maior. Ou seja, mais resistente ao calor, que consegue ter correntes de maior intensidade e pode suportar mais tempo de operação”, explica.

Como a demanda hoje é maior que a oferta, a aposta da Ceitec é aproveitar essa “janela de oportunidade” para a geração de uma linha de produtos que atenda empresas como citadas recente pela titular do MCTI, a chinesa BYD, produtora de veículos elétricos e a WEG, pioneira no desenvolvimento de soluções em geração de energia solar no Brasil.

Quadro funcional

Mas para que a empresa que retome rapidamente sua produção, uma série de reuniões está sendo feita para que de forma emergencial “pessoas que queiram ajudar a reconstruir a Ceitec”, diz Gadelha Vieira, sejam contratadas.

O executivo diz que a princípio, a não ser que haja uma ordem judicial, a empresa não pode readmitir os profissionais que foram demitidos no processo de liquidação de Bolsonaro.

“Nós não vamos fazer, nesse momento, nenhum concurso público em grande escala. O que nós vamos fazer, realmente, é começar a atrair pessoas competentes do mercado para voltar à operação aqui na Ceitec”, fala.

O modelo ainda está em estudo, mas em discussão acelerada. “Estamos vendo como fazer. Ou por contratos especiais ou Cargos de Comissão. Nós também estamos analisando qual o número”, informa.

Para o executivo, o processo de liquidação da Ceitec dispersou um quadro técnico de excelência que hoje está trabalhando inclusive no exterior.

“Durante o período de liquidante eu percebi que realmente houve um ato, acredito, irresponsável do governo anterior. Não que uma estatal não possa ser privatizada ou mesmo liquidada; tem que haver planejamento e avaliação de vários fatores. Pessoas que de alguma forma agregaram valores para o Estado, para o país, foram dizimadas. Elas foram espalhadas. Tem gente nossa na Europa, nos Estados Unidos. Pessoas que poderiam estar trabalhando aqui com os novos produtos”, reclama.

Resgate de confiança

Além da perda de capital humano, Gadelha Vieira registra outro prejuízo decorrente da decisão do governo anterior: a quebra de confiança de vários clientes da empresa que já se identificavam mais na iniciativa privada do que nos ambiente governamentais.

“Sem nenhum motivo, de repente, foi declarado que empresa estava fechada. Então, aqueles clientes que estavam adquirindo produtos, nós teremos que reconquistar”, explica.

Não é à toa que entre as seis reuniões que Gadelha Vieira participou na última quinta-feira, 16, ele ainda arrumou tempo para promover duas visitas técnicas ao complexo da Ceitec.

“É preciso resgatar a confiança do mercado que perdeu uma fornecedora antiga que deixou de operar adequadamente porque foi fechada. Daí, depois de três anos, você o quer de volta. É complicado, né?”, conclui.

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