MOVIMENTO

Grito dos excluídos mobiliza Porto Alegre com protestos contra a fome e distribuição de comida

Mobilização marcou feriado da Independência com atos em defesa da democracia e direitos em todo o país. Na capital gaúcha, MST doou marmitas e arroz orgânico para população de rua
Por Gilson Camargo e Igor Sperotto (fotos) / Publicado em 7 de setembro de 2022

Grito dos Excluídos na capital gaúcha reivindicou dignidade e direitos

Foto: Igor Sperotto

Porto Alegre que ostenta um dos maiores índices de exclusão, com mais de 50 mil pessoas empurradas para a miséria e a situação de rua a cada ano, e onde a cesta básica é a segunda mais cara do país, amanheceu nesta quarta-feira, 7, dia da Independência, sob uma colorida onda de protestos por comida, moradia, trabalho e dignidade nos atos do Grito dos Excluídos.

A mobilização questiona as comemorações do dia da Independência em uma conjuntura marcada pela fome, o desemprego e a recessão econômica que excluem quase um quarto da população brasileira, e de ameaças à democracia.

Sem Terra

Agricultores dos assentamentos da reforma agrária do MST distribuíram 750 marmitas e uma tonelada de arroz orgânico

Foto: Igor Sperotto

Numa resposta às fake news que tentam associar a eventual eleição de um governo de esquerda à invasão de terras, os agricultores dos assentamentos da reforma agrária do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) distribuíram 750 marmitas e uma tonelada de arroz orgânico para as pessoas que participaram da caminhada na capital gaúcha.

Em São Paulo, tendas foram montadas na Praça da Sé para receber a população em situação de rua. Um café da manhã foi servido por voluntários para 5 mil pessoas. O Movimento da População de Rua, a campanha “Gente é para brilhar e não para morrer de fome”, os Comitês Populares e o MST também distribuíram 3 mil kits com pães e frutas e arroz doce preparado com produtos das cooperativas de agricultores.

Resgatar o país

Nas ruas, questionamento à ‘Independência’ e protesto contra a fome

Foto: Igor Sperotto

“É dia de lutar pela democracia, pela vida, contra o golpe que estão querendo dar contra as instituições e sobretudo contra os direitos; por terra, democracia, trabalho, teto e comida na mesa. É o básico que estamos pleiteando nessa caminhada de esperança, na luta para que a gente tenha um país de justiça e inclusão. Continuaremos em marcha até retomar o Brasil para o rumo da justiça e da igualdade e resgatar essa enorme dívida social”, destacou Amarildo Cenci, presidente da CUT-RS.

Organizada por um coletivo que reúne organizações da sociedade civil, trabalhadores e trabalhadoras, representantes de movimentos sociais, pastorais sociais e comunidades, a mobilização histórica voltou a ocorrer na capital gaúcha após interrupções por causa da pandemia – essa foi a 20ª edição no RS.

Com oito eixos temáticos, o movimento pautou a defesa da democracia, luta por inclusão, direitos, políticas públicas que garantam dignidade às populações mais vulneráveis como segurança, saúde e educação, contra o racismo, e pelos direitos à saúde, à educação, à alimentação, à terra, à água; com a palavra de ordem “Vida e Democracia: Não ao Golpe! Por Comida, Terra, Teto e Trabalho”.

No país, o 28º Grito dos Excluídos e Excluídas mobilizou as principais capitais e regiões metropolitanas com o tema permanente “Vida em Primeiro Lugar”, reunindo milhares em concentrações, atos e caminhadas.

Caminhada

Caminhada teve ato inter-religioso e interação com a comunidade

Foto: Igor Sperotto

Após concentração às 9h, em frente à igreja São José do Murialdo, no bairro São José, os manifestantes seguiram pelo bairro Partenon. No trajeto, a marcha teve apresentações culturais, interações com a comunidade e atos contra o racismo e a exclusão, sempre acompanhadas das chamadas do movimento: “Brasil, 200 anos de (in) dependência. Para quem?”, questionam.

A caminhada passou pela rua Primeiro de Setembro e avenida Bento Gonçalves, até a Praça Francisco Alves. Na zona Norte, um ato contra o racismo interrompeu a marcha em frente ao supermercado Carrefour, no bairro Passo D’Areia, para lembrar a morte de Beto Freitas, assassinado por seguranças da loja em novembro de 2020. Um “grito contra a fome” e ato inter-religioso ao lado da igreja São Judas Tadeu encerraram as manifestações.

Capitais

Em São Paulo, manifestantes ocuparam a Praça da Sé

Foto: Guilherme Gandolfi, Junior e Emilly/MST Oficial

O 28º Grito dos Excluídos teve mobilizações com distribuição de alimentos em 20 capitais do país. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que integra a organização nacional, divulgou carta em defesa do evento.

“Queremos que os rostos e gritos de todas as realidades sejam vistos e ouvidos. É marca histórica do Grito, desde seu início, a defesa da democracia e da soberania dos povos”.

Comida para quem tem fome

Manifestantes distribuíram café da manhã para 5 mil pessoas e 3 mil kits com pães e frutas e arroz doce em situação de rua em tendas montadas na Sé

Foto: MST/ Divulgação

Em tendas montadas na Praça da Sé, no centro de São Paulo, os manifestantes distribuíram café da manhã para 5 mil pessoas em situação de rua. O Movimento da População de Rua, a campanha “Gente é para brilhar e não para morrer de fome”, os Comitês Populares e o Movimento Sem Terra (MST) também distribuíram 3 mil kits com pães e frutas e arroz doce preparado com produtos das cooperativas do MST.

“A ação deste ano ocorre em um momento em que os dados relacionados à insegurança alimentar no Brasil são alarmantes, considerando que além de termos voltado ao mapa mundial da fome, já contabilizamos mais de 33 milhões de pessoas famintas no país”, ressaltou Carla Bueno, engenheira agrônoma do setor de produção do MST.

A cozinheira da União dos Movimentos por Moradia (UMN), Maria Conceição Guimarães, 64 anos, resumiu a iniciativa de distribuir comida à população de rua. “Nosso objetivo é matar a fome, não pregar o ódio. A população está com muita fome, diferente do que dizem candidatos, de que não existe fome”, disse.

Cozinhas solidárias

No Espírito Santo, manifestantes protestam contra o governo de Jair Bolsonaro (PL) em Vitória. A marcha organizada por mais de 60 entidades, entre igrejas, sindicatos e movimentos sociais saiu da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) às 9h40min rumo à Pracinha do bairro Gurigica. Ao meio-dia, o MST distribuiu refeições preparadas por cozinhas solidárias da reforma agrária. O ato terminou com uma celebração religiosa.

“Sempre tentamos trazer um contraponto à Independência. Já tivemos temas em alusão às barragens da Vale, sobre a saúde na pandemia e agora, nos 200 anos, questionamos ‘Independência para quem?’”, lembrou José Maurício Ferraz, que integra a organização do movimento em Belo Horizonte, em Minas Gerais. A mobilização começou na Praça Coronel Guilherme Vaz de Melo, no bairro Lagoinha, na Região Noroeste de BH, com marcha até a rua Pedro Lessa.

Movimento estudantil

No Recife, a mobilização começou às 8h, no Parque Treze de Maio, em frente ao prédio central da Faculdade de Direito, e contou com a participação do movimento estudantil.

“Devemos ter em mente que os milhões de brasileiros com fome atualmente revelam a falta de um projeto de soberania e de desenvolvimento. Esse é o momento de debater o Brasil que a gente quer nos próximos 100 anos, e com um grande pacto pela redução das desigualdades sociais”, alertou Bruna Brelaz, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE).

“Enquanto deveríamos estar debatendo medidas para avançar, investir em educação e em desenvolvimento, o governo usa essa data para atacar o sistema eleitoral e inflamar sua base, criando mais ‘cortina de fumaça’ para a crise que causou”, criticou Jade Beatriz, presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes).

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