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No início de novembro, a escritora gaúcha Luisa Geisler teve cancelada sua participação na Feira do Livro de Nova Hartz.
O motivo alegado foi que seu último livro, Enfim, capivaras (Companhia das Letras, 2019), apresentava “um vocabulário chulo” e que “o ouvido das nossas crianças não é privada”, segundo o vereador Robinson Bertuol (PSC).
Luisa conversaria sobre o livro com adolescentes de 11 a 15 anos. A narrativa conta a história de um grupo de amigos que sai para procurar uma capivara supostamente perdida. No meio da busca, eles repassam diversos questionamentos que fazem a si próprios e ao mundo em geral.
Casos semelhantes têm ocorrido Brasil afora. Geralmente, ganham notoriedade quando há algum político envolvido, como o da história em quadrinhos da Marvel censurada pelo prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos), durante a Bienal do Livro.
Mas situações assim ocorrem frequentemente no âmbito escolar. Cada vez mais, professores se veem impedidos de indicar livros porque contêm palavrões, cenas de sexo ou de violência. Há quem fique escandalizado com um “vai tomar no cu” que aparece em Romeu e Julieta, de William Shakespeare.
Com frequência, Rubem Fonseca sai das listas de leituras por causa de seus textos crus que expõem uma realidade com a qual os estudantes convivem diariamente através dos telejornais ou de jogos de videogame violentos, como GTA V ou Call of Duty.
Quando o professor indica um livro que apresenta qualquer das características acima, ele acaba sendo visto como um apologista da violência e da promiscuidade. Normalmente, acaba demitido do colégio particular ou afastado da escola pública.
Enquanto isso, as editoras têm feito torcida para que políticos como o presidente e seus filhos escolham um livro de seu catálogo para achincalhar. O efeito que esses políticos pretendem atingir tem provocado justamente o seu oposto: o livro se esgota rapidamente. Todos querem descobrir o que havia de tão pecaminoso nesse objeto. Infelizmente, editoras e escritores não parecem se importar com os professores que indicam seus livros.
Fahrenheit 451, de Ray Bradbury, previu que os livros seriam vistos como objetos perigosos, porque fazem pensar, e acabariam impedidos de circular, num mundo em que os bombeiros existem para queimá-los. Lá também há a figura do professor Faber, que ajuda o protagonista a fugir. Faber não pode mais dar aulas de Literatura. Será este o futuro das letras no Brasil? Sempre pode piorar: os professores irão junto com os livros para a fogueira?
Marcelo Frizon é professor de Língua Portuguesa e Literatura